terça-feira, abril 25, 2006

Um cafajeste infantil.


Algumas coisas mudaram de um tempo pra cá. Não vejo mais os pais perguntando a seus filhos a antiga indagação: O que você vai ser quando crescer?
Tinha quem escolhia ser astronauta, motorista de caminhão ou bombeiro. Hoje tenho medo das respostas: Jogador de futebol, Profissões nerd’s ou Estilista de moda são algumas que você corre o risco de ouvir.

Quando cheguei em casa, lá pelas oito da noite, estranhei o incomodo e tranqüilo silencio do ambiente. Imediatamente procurei minha mulher :
- Você colocou o Lucas de castigo porque??
- Não coloquei ele de castigo. Ele esta é meio febril. Tá gripado.
Isso explicava toda aquela paz. Ao contrario de outros dias, as almofadas estavam arrumadas e não haviam 684 carrinhos misturados com bolachas Trakinas no chão da sala.
Fui ate o quarto e lá estava o amoadinho Lucas vendo desenho. Ele me sorri sem graça e se concentra e seus salgadinhos. Coisa boa de morar no andar desse prédio, que eu moro, é que na porta ao lado , reside um pediatra, o doutor Marco. Como pai zeloso, sempre o consulto sobre a saúde de Lucas. Afinal, ele nem me cobra nada. O medico tira seu estetoscópio e declara:
- Não é nada serio. Ele tem um pouco de catarro - Ele vai falando e escrevendo em seu receituário. Destaca a folha do bloco e passa a minha esposa - Compre isso e de bastante liquido ao menino. Logo ele estará novo em folha.
Minha mulher lê e o medico vai saindo. Eu pergunto:
- Doutor, quanto é sua consulta?
- "Mágina"! Não é nada não. Cuido dele desde nascido. - Eu bato em suas costas e abro o sorriso:
- O doutor que sabe. Precisando de algo da prefeitura, tamos ai! Só passar lá na minha sessão!
Pego a receita da mão de minha mulher e leio:

"Broncolinil. Supositório Infantil. Aplicar antes de dormir por 3 dias."

- Mas que filha duma puta! Receitou isso pro Lucas??! Só pode ser sacanagem! Que corno! Se eu pagasse a consulta ele ia passar um xarope ou um remédio em comprimido, mas consulta de graça, o safado receita supositórios!!
- Calma - Diz minha mulher - que tem isso demais??
- Num me fode! Isso é uma humilhação sem tamanho!
Lucas ouve a conversa de só um orador com atenção. Levanta os olhos e me pergunta de pronto:
- Mas o que é isso que o medico quer me dar? Injeção? - Eu olho pra seu rosto e não tenho palavras:
- Hã...ele...remédio, é remédio! ...ele te passou....quer dizer...olha moleque, esse bagulho chama-se supositório.
- É ruim pai? É amargo?
- Não, nem sei o gosto disso. É como se fosse um comprimido, só que compridinho. É um remédio que a gente enfia no cu. Foda explicar isso pra você.
Os olhos da criança se arregalam. A boca fica aberta. Ele está transtornado e confirma com a mãe:
- É mentira do pai, né mãe?? Não existe isso de colocar remédio "lá", né?
- É verdade de seu pai. Mas não tem nada demais. Ele mesmo já deve ter usado isso quando criança... - Eu parto pra ignorância:
- O CARALHO!! Nunca deixei minha mãe usar isso em mim. Nem fodendo!
Minha mulher perde a calma e surta:
- Seu imbecil! Como você fala uma merda dessas na frente da criança??!? Você é um idiota mesmo!! - Lucas já tomou sua decisão:
- Se meu pai não usou, não vou usar também!

Nos minutos seguintes, eu e meu filho, estávamos no carro indo á farmácia mais próxima. Estacionei e fui falar com o atendente:
- Escuta, o medico receitou esse esquema aqui, mas o pentelho não deixa a gente usar nem a pau. Tem outro tipo de método? Um xarope, sei lá. - O balconista lê a receita e coça o queixo pensativo:
- Broncolinil. Só ser for injetado. Criança mimada é problema. Sempre usei supositório e os resultados são rapidíssimos. - disse com trejeitos efeminados. Olhei bem pra cara do baitola e deixei quieto. Fui ate o carro falar com Lucas.
- Tu vai tomar uma injeção.
- Tudo bem, eu tomo injeção, mas não quero enfiar nada no cu.
- Olha a boca, rapaz!

Na sala, a atendente prepara a agulha na seringa. Ela brinca pra quebrar a tensão do menino:
- É só uma picadinha, não vai doer nada. Baixa a bermuda. - Meu filho me olha apavorado e pergunta:
- Num dá pra ser no braço não, pai??

Na viajem de volta, meu pequeno herói tem a nádega esquerda dolorida mas o orgulho esta intacto. Ele joga seu game boy no banco traseiro do carro e sigo pra casa. Pergunto-lhe pra puxar conversa:
- Lucas, que você vai ser quando crescer? - Ele pausa o aparelho e fala com firmeza:
- Eu vou ser bombeiro , pai.
- Sei. Vai apagar incêndios e essas coisas...
- Não pai. Vou ser bombeiro e namorar a Luma.

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